quinta-feira, 12 de julho de 2007

O amor que nos torna próximos dos outros

Uma pequena historinha pode nos ajudar a compreender melhor a Palavra de Deus de hoje: “Um rabbino perguntou um dia a seus discípulos: quando termina a noite e começa o dia? Um respondeu: quando vendo de longe um animal sei dizer se é um cão ou um gato. O mestre disse: não! Outro tentou: quando de longe posso dizer se uma árvore é um pêssego ou uma figueira. O mestre disse de novo: não! Então – perguntaram os discípulos – quando? O mestre disse: até que, olhando nos olhos de uma outra pessoa, não vê que ela é teu irmão ou tua irmã, no teu coração será sempre noite!”
A Palavra de Deus dirigida a nós neste domingo através do Evangelho de São Lucas, leva-nos a refletir que a construção de um mundo melhor passa primeiro pelo reconhecimento do valor do outro/a em nossa vida. Nós não nos fazemos sozinhos, nos tornamos gente na medida que nos relacionamos e nos fazemos seres de relação.
Jesus ao ser interpelado por um mestre da lei que o questiona sobre como deve fazer para herdar a vida eterna leva-o a reconhecer que não basta apenas saber de cor a lei, mas que à vontade de Deus deve ser concretizada no chão da vida concreta. Logo, o amor para se fazer visível deve ser traduzido em ações que nos tornam próximos uns dos outros.
Entretanto, falta aos doutores da lei e tantos cristãos/as hoje a sensibilidade para a prática do amor que se traduz em misericórdia, assim como fez o samaritano. A parábola do “bom samaritano” é própria de Lucas e apresenta um caso típico para prática da misericórdia. A pessoa que caiu nas mãos dos assaltantes encontra-se à beira da morte. Passa um sacerdote, preocupado com o culto e com o risco de se contaminar, passa adiante, pelo outro lado. A mesma coisa faz outro homem religioso, o levita, porque sua preocupação está em saber “quem é o meu próximo” e não em saber aproximar-se a fim de ser próximo de quem passa necessidade. Por último passa um samaritano, um impuro, um inimigo, membro de um povo marginalizado e ridicularizado pelos judeus através de seu código da lei, ele consegue perceber que antes de tudo é preciso prestar um serviço de amor (Cf. vv. 31-33). Por isso, age simplesmente a partir do que sente e do que vive. Compadece, pois, sente na pele a dureza de ser marginalizado. Ele “teve compaixão”, gesto eminentemente divino, que se traduz na solidariedade plena com os deserdados da vida. Na parábola contada por Jesus, vemos como a misericórdia, ou seja a paixão-com, se torna eficaz na medida que faz a vida renascer. E por isso mesmo, afirma aproximidade entre as pessoas. Pois próximo, confirma o mestre da lei ao final do Evangelho, é aquele que usou de misericórdia. Não foi no Templo, no culto ou nos ritos que o samaritano encontrou Deus, mas no inimigo à beira da morte. Sua atitude nos revela a lei que deve estar gravada no coração, ou seja, a lei da vida, como nos convida a primeira leitura tirada do livro do Deuteronômio.
Moisés ao convocar o povo para cumprimento da lei de Deus insiste que esta não se pode encontrar fora das pessoas, fora da vida “Ao contrário, esta palavra está bem ao teu alcance, está em tua boca e em teu coração, para que a possas cumprir” (V. 14). Portanto, qualquer lei só se torna justa e verdadeira à medida que promove a vida e, nela e por ela, se traduz a sua eficácia .
Neste sentido, nos diz Paulo através de sua Carta a comunidade de Colossenses, Deus se fez presente no meio de nós. Em Cristo, centro da revelação de Deus, temos a verdadeira imagem de Deus. E é unicamente com Ele e por Ele é conseguiremos herdar a vida eterna
Portanto, queridos irmãos e irmãs ao celebrarmos o mistério pascal, neste domingo, somos convidados a revermos os caminhos de nossa prática pastoral. Em que se apega as nossas opções? Nas doutrinas moralistas e legalistas ou nos apelos da vida e do coração? Por outro lado, sabemos que trilhar a proposta de Jesus é um processo que exige conversão e abertura para reconhecermos que sua presença no meio de nós nos convoca e nos envia para construirmos a verdadeira religião, aquela que se coloca ao lado dos que são privados de ter uma vida com dignidade: “vá e faça a mesma coisa”. E neste sentido, podermos sonhar e lutar para que o Brasil, especialmente o Rio de Janeiro, possa ser futuramente o lugar onde a vida se realize em abundância, não somente lugar preparado para sediar competições de campeonato Pan-americano ou outro, mas que seja campeão de não violência, e, que nossas crianças não morra por falta de alimentação, saúde ou educação. E assim, irmos no fazendo próximos daqueles que nos são colocados no caminho.

Tânia Regina da Silva

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